sábado, dezembro 31
quinta-feira, dezembro 29
Sobre mulheres e cigarros
Gioavanna já era mulher na época em que eu era um garoto
babaca e besta. Loira tingida, mais baixa que a média, era minha grande
conquista – aos sábados, aparecia de repente em casa, de carro, para que
fossemos beber cerveja em um boteco qualquer – e, ao mesmo tempo em que, aos
dezessete, possuir uma mulher com vinte e dois me deixava com a sensação de ser
mais adulto e mais homem do que eu era de verdade, a beleza estonteante daquela
mulher me deixava inseguro e apreensivo como se eu fosse ainda mais juvenil do
que eu realmente era. Foi Giovanna quem me ensinou a apreciar o gosto de
nicotina em sua boca sempre ligeiramente adocicada e me ensinou todos os
caminhos para dar o máximo de prazer a uma mulher. Após alguns meses, fui
trocado por um fumante doze anos mais velho que eu, dono de uma bela motocicleta estilo chopper.
Esta mulher me marcou de um jeito que durante anos eu preferia
as fumantes, para apreciar a nicotina através das bocas das mulheres ou, hoje
eu sei, sentir novamente o gosto de Giovanna.
Muitos anos depois, conheci Bernadete. Linda,
loira de olhos verdes, era uma simples menina, nada inocente, porém, enquanto
eu já era um homem feito, embora ainda mais babaca e infantilmente besta. Eram doze anos de diferença. Eu continuava
sendo um não fumante amante do adocicado gosto de nicotina em bocas femininas e
Bernadete estava sempre com um cigarro aceso em mãos. Fumava e segurava o
cigarro de um jeito incrivelmente sexy. Era uma verdadeira Pin-Up, que me fazia
babar com incrível facilidade. Amei aquela menina como qualquer coroa em crise de
meia idade ama uma pós-adolescente e, definitivamente, viciei naquele sabor e
na fumaça, que frequentemente me envolvia.
Quando fui trocado por um cara da minha altura, da minha
idade e ruivo como eu, porém fumante, percebi que não tardaria para que eu
finalmente acendesse meu primeiro cigarro. E esse momento veio graças a Roberta,
uma prostituta aposentada, vingativa, que quase nunca me beijava – resquícios
da época de vida nada fácil que levara, onde adquiriu o hábito de não beijar
nunca –, impedindo assim que eu alimentasse o vicio que adquirira sobre o sabor
da nicotina. Tal abstinência somada a seus rompantes de fúria e estupidez, que me
deixavam extremamente tenso, colocaram o primeiro cigarro em minha mão, em
minha boca, e fez meu mundo mudar. Eu encontrei a paz, o paraíso, a divindade. Passei
a sentir em minha própria boca o adocicado gosto e não mais consegui sentir com
a mesma intensidade que antes o gosto da nicotina nas bocas que eu beijava rua
afora.
Talvez por isso, cheguei até Julieta, jovem e atlética, toda
dura e firme, ex-fumante e viciada em sexo, que tentava a todo custo me
convencer a não fumar, afinal todo ex-fumante é assim mesmo chato e, sendo
honesto, meu fôlego, um pouco por causa do cigarro e outro tanto pelo
sedentarismo, impedia que eu rendesse, sexualmente, claro, o tanto quanto ela
precisava para alimentar seu vício. Seu desespero chegou a um nível que ela
impôs uma espécie de greve de beijo caso eu chegasse perto dela logo após um
cigarro. E aqui cabe uma menção honrosa à boca de Julieta. A boca dela era
divina, fosse me beijando, fosse meu chupando, de um jeito que me dá saudades
sempre que penso nela.
Tathiane, a segunda loira tingida da minha vida – mas esta
porque que tinha a mesma idade que eu, e os cabelos brancos afetavam seu ego –,
já mulher robusta, completamente doida na cama, adepta do BDSM, e fumante, tem
na boca aquele gosto de nicotina no qual viciei. Sempre que saíamos para beber,
ela parava de falar no exato momento em que eu acendia um cigarro. Seus olhos
brilhavam e ela se excitava. Adorava me ver fumando. Dizia que fico
incrivelmente sexy.
Ela também adorava o gosto de nicotina na minha boca e gostava
que eu fizesse marcas de cigarro em suas costas quando me chupava.
Pauline, morena de olhos verdes, alta, com quadril largo,
cintura fina e os peitos mais lindos que eu já vi na vida, é uma perdição em
forma de mulher e, por algum motivo que nunca entendi qual, era completamente
louca por mim e até hoje me idolatra. Tingia o cabelo de loiro só para me
agradar. Costumava viajar quilômetros só para termos uma noite de sexo. Quando
me via, não conseguia parar de me beijar, tivesse eu fumado ou não. Nunca
fumou, mas me presenteava com maços de cigarros, Zippos e outros utensílios.
Uma loucura.
Meu grande problema é, e sempre foi, Ceci, minha grande
paixão platônica.
Conheci Ceci há quinze anos, em uma biblioteca, quando ambos
saímos para fumar um cigarro. Loira, claro, e inteligente de um jeito que faz
você se sentir um idiota, eu a poderia ouvir falando durante horas, mas ela
costuma beber tanto que apaga cedo. De vez em quando, ela me liga para irmos a
algum boteco beber, porque Ceci adora sentar comigo num boteco para dividirmos
algumas garrafas de cerveja. Seu problema é ser lésbica radical. Não é
preconceito, mas por causa de sua opção sexual, ela não me beijaria nem se eu
fosse o próprio cigarro, enquanto eu fico aqui doido de vontade e me sentindo
um babaca adolescente, mesmo com meus cabelos grisalhos.
Com licença, mas preciso de um cigarro.
quinta-feira, dezembro 8
O vazio e a saudade
Ontem sai do escritório sem destino, com a cabeça em você,
presença constante, que me tomou o raciocínio lógico, e dirigi sem saber
direito para onde eu seguia, até que passei em frente àquele bar, naquela
esquina onde bebemos cervejas juntas pela última vez. Foi a ultima vez que nos
vimos ou que nos falamos. Senti uma pontada diferente, uma saudade de algo que
nunca tive, e sem que eu percebesse, ou entendesse direito o porquê, meus olhos
queimaram e senti meu corpo todo arder neste inferno no qual você me colocou.
Estacionei o carro e fiquei ali, em silêncio, quieta, não sei por
quando tempo, não reparei, mesmo porque, por você, eu perdi completamente a noção
de tempo, de um modo geral. E, no silêncio, deixei o vazio me invadir, deixei a
dor maldita me dominar.
Sai do carro, enfim, e me sentei a uma mesinha do lado de fora do
bar, perto da mesa onde a gente se sentou daquela última vez. O bar estava
vazio, claro, afinal era segunda-feira, senão por um grupo com cinco amigos – homens
bebendo cerveja e fumando e rindo e falando palavrão. E eu ali, do lado, sozinha,
me sentindo uma extraterrestre.
Pedi um rabo de galo ao garçom, mas não bebi - você sabe que odeio rabo de galo. Fiquei apenas sentindo o
cheiro da sua boca até ter a perfeita noção de que seus lábios tocavam os meus,
naquele beijo enlouquecedor que só você deve saber dar e que eu só provei em
sonhos. Junto com o rabo de galo, o garçom me trouxe uma porção de torresmo,
com limão, do jeito que você sempre gostou de comer. Pedi também uma cerveja e
um maço de cigarros, exatamente como da última vez que estivemos ali. Pena que
dessa vez você não estava.
Aliás, como é isso de me menosprezar, ignorar que te amo, me jogar
de lado só porque eu me apaixonei por você? Como é ser o único ser humano que
não me deseja? Como é ser quem me faz sofrer as dores de todos os amputados? E
por que insiste em me ignorar, em não atender minhas ligações, não responder
meus e-mails desesperados clamando pelo direito de ouvir sua voz uma última
vez, de ver seus olhos novamente? Cadê a humanidade em você, para me tirar
desse fundo de poço em que você mesma me meteu?
Antes de terminar a cerveja, decidi sair do bar, dar uma volta, ou
qualquer coisa para tentar te esquecer. Rodei sem rumo e a necessidade de ver
alguém, ver pessoas, me estrangulava. Decidi ir ao Clube 6Sixxx6, o único lugar
aberto nas noites de segunda -feiras, e assim, claro, tive que passar na rua
das putas. Agora, me diga, por que eu tenho a sensação de que todas elas são
muito mais gostosas do que eu? É até difícil entender por que uma mulher
gostosa daquele jeito foi virar puta. Talvez por isso que às vezes sinto
vontade de passar uma noite na rua, só para ver como é.
Estava pensando nessas coisas quando uma japonesa, que me lembrou
você, mexeu comigo. Eu devia estar com uma cara péssima.
“Gata, não fica sozinha, não. Vamos sair”, ela disse algo assim. Era
linda.
Sem saber direito o porquê, parei o carro, voltei de ré e
perguntei o preço.
“Para você? Olha, você é tão linda e tão gostosa que te chuparia
de graça”, ela disse apoiando-se na porta do carro e deixando assim eu ver os
seios lindos e duros dela. Destravei a porta e ela entrou no carro. Fomos até
um hotel barato que tinha ali na rua mesmo. Faria bem para mim, sabe, sair com
outra mulher, estar com alguém, esquecer um pouco você.
Mas não esqueci.
Fiquei de olhos fechados enquanto ela me chupava. Olhos fechados e
pensando em você, imaginando que era sua boca em mim. Mas não gozei. Não
consegui. Faltava você. Falta você.
Saímos do hotel e a deixei na esquina onde a encontrei. Ela não
quis receber, disse que era puta de palavra, que tinha tido tesão em mim e por
isso o fez de graça. Agradeci e dei-lhe um longo beijo na boca de despedida. Só
no caminho de volta que percebi: nem perguntei seu nome.
Parei o carro em frente do meu prédio. Não entrei. Fiquei ali, sozinha,
ouvindo Garbage, tensa, sem conseguir sair do carro, sem conseguir ter sono e sem conseguir dormir. Somente quando o Sol nasceu, eu decidi sair de lá, entrar
em casa, tomar um banho, trocar de roupa e voltar para o trabalho.
Está difícil sem você. Insuportável, na verdade. Uma merda você
e esse maldito vazio que não me deixa mais viver. Uma merda.
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